O retorno do retorno

>> quarta-feira, 9 de maio de 2012


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De todos os germes de loucura que
um dia possam brotar, há um que 
tem me incomodado bastante
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Todos sabem que a barreira entre a sanidade e a loucura é mais fina do que Magipack: uma esticadinha, uma alfinetada e, pronto, nosso sarapatel de caraminholas pode entornar sobre a reluzente fórmica da consciência. Convenhamos, se fosse possível filmar o que passa por sua cabeça numa mera ida à padaria, você seria amarrado a uma camisa de força antes mesmo de conseguir comer um pão na chapa, tantas seriam as sandices sem nexo -e, pior ainda, as com nexo- projetadas na tela do pensamento.
     De todos os germes de loucura que, temo, um dia possam brotar, há um que tem me incomodado bastante ultimamente. Trata-se de uma loucura antiga que agora resolveu me visitar de roupa nova. A loucura antiga, que me acompanha desde que me conheço por gente -desde, portanto, que me desconheço-, é a seguinte. Estou numa estrada. Avisto uma placa de retorno. Meu medo é pegar esse retorno, fazer o oito no viaduto sobre a estrada e, do lado de lá, entrar novamente no retorno para o sentido em que eu vinha. Chegando ao ponto de partida, mais uma vez, pegaria o retorno, e ficaria preso nesse circuito de autorama até acabar a gasolina, até, quem sabe, ser parado pela polícia com tiros no pneu -mas quem garante que, então, não seguiria a pé, fazendo sempre o mesmo caminho, entregue à satisfação infantil da repetição?
     A versão atual da fantasia tem o mesmo conteúdo, mas o cenário não é mais uma estrada, e sim as redes sociais e o e-mail. Estou no meio de um texto e ouço o bipe de chegada de mensagem. É a placa de retorno, acenando-me, a chamada para que eu saia da rota. Assim faço: minimizo o Word e abro o Outlook. Se eu logo voltasse ao trabalho, estaria tudo certo, mas não: decido pegar um outro desvio e abro o Facebook. Não satisfeito, entro no Twitter. Então, quando estou indo pro Word novamente, penso: por que não abrir o e-mail, só mais uma vez?
     Só mais uma vez? Será? Quem garante que, terminado o segundo passeio pelo circuito, eu não vá recomeçá-lo? E re-recomeçá-lo? E re-re-recomeçá-lo? Como saber se eu conseguirei sair dessa montanha-russa do diabo, dessa inútil roda de ratinho de laboratório? Há dias em que passo 30, 40 minutos indo de um programa pro outro, como uma bola de pinball sendo ricocheteada pelos pinos e barras coloridas da máquina.
     Alguns anos atrás, no metrô, vi um cara atravessar a estação tocando todos os cartazes de publicidade com o indicador da mão direita. Quando chegou ao fim, parou, virou-se e percebi em seus olhos vidrados o desespero do abismo. Era a placa de retorno que ele encarava. Respirou fundo, como se prestes a encarar uma missão enfadonha, mas incontornável, e cruzou a estação no sentido contrário, tocando as mesmas placas com o indicador esquerdo.
     Acho que meu Magipack ainda está em boas condições, mas não custa deixar o aviso: por favor, Andressa, Lívia, Denise, Daniela e Adriano, se um dia minha crônica não chegar ao jornal, contatem um parente, peçam para um vizinho atirar garrafas de água mineral e maçãs pela janela do escritório, para o zelador cortar minha luz. Há grandes chances de que eu esteja preso no retorno do retorno do retorno do retorno do retorno...


@antonioprata

E eu estou aqui, morrendo de medo de me tornar como o Antonio Prata (meu cronista preferido, você sabem disso né?).
Só uma olhadinha nos e-mails, ah! só no facebook, no twitter, hum.... mas eu preciso trabalhar, então vou para o site da empresa; ah! mas alguém me enviou um e-mail; tem alguém me chamando no FB, ah! será que fulano respondeu o e-mail, deixa eu olhar............ hum...... o dia passou...... até amanhã.

beijos

5 comentários:

Valéria 9 de maio de 2012 às 16:54  

Oi Macá!
rssss
Amei a crônica!
Esta é das mazelas nos novos tempos.rss Estamos sempre avistando estas placas de retorno para lugar nenhum, até mesmo porque sobreviveríamos sem todos eles. Será?rsss
Beijinhos!

Lu Souza Brito 10 de maio de 2012 às 09:29  

Oi Macá.

Medo desta cronica, ahahah. É assim mesmo. Abro o face, rapidinho vai...ta tranquilo no trabalho. Mas dai a chamada pro blog da Macá e aqui estou eu comentando, e daqui a pouco vou para o email.

Afffffff, é preciso ter cuidado, ahahahah.
Bjos
Lu

Beth/Lilás 13 de maio de 2012 às 00:48  

Querida Macá,
Que seu dia das mães seja festejado junto com seus queridos e parabéns a você, linda e carinhosa mãe!
Te enviei email de resposta ao seu, você viu?
bjs cariocas

pensandoemfamilia 13 de maio de 2012 às 01:29  

Rs,rs, boa.
Feliz dia das mães.
bjs

Luma Rosa 13 de maio de 2012 às 02:02  

Nossa, eu já fui louca de pedra então!! E essa sensação de ser um ratinho manipulado é bastante real. Eu acordava e a primeira coisa que fazia era ligar o computador, naquela época que ouvia-se uma musiquinha e demorava séculos para abrir a máquina e carregar uma página. Deixava conectando enquanto ia para o banho e corria de um lado para o outro no intervalo de carregar uma página. Atualmente tudo é tão mais rápido e eu só entro online quando já estou no carro rumo ao trabalho.
Na época anterior que citei, participava de leilões online e tinha que ficar ligada em preços. Vencia as licitações quem conseguia manipular o menor preço.
Assuntos de blogues ou email pessoais, facebook e twitter somente depois do trabalho. Não posso misturar as duas coisas senão não consigo me concentrar no trabalho. Mas para quem é viciada em tecnologia, não posso deixar a vontade falar mais alto que a razão e me seguro bastante para não cair no erro da procrastinação.
Em casa acontece o mesmo lance do trabalho, só entro online depois que a casa dorme, pois daí não fico dividida. Mas não entro nessa pilha do cronista. Leio meus emails apenas uma vez no dia.
Feliz dia das mães! Que seja doce, muito doce!! Beijus,

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